quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Últimas impressões sobre o Festival do Rio 2010:


Sofia Coppola é um caso bem sucedido de quem encontrou o seu jeito de filmar e agora segue experimentando. Mostrando cada vez mais domínio sobre a narrativa anticlimática e elegendo o tédio como interlocutor, Sofia segue investigando uma subjetividade atual e bastante comum, e a pergunta parece ser sempre a mesma: com o que será que se importam as pessoas hoje?

As referências pop aparecem cada vez mais naturalizadas (algo que deve ter feito Tarantino vibrar a ponto de premia-la em Veneza): a batalha de Guitar Hero só perde para o diálogo entre pai e filha sobre a história da Saga Crepúsculo, cuja citação não precisa nem ser explícita. Interessante também como Sofia se apropria de detalhes afetuosos, como a tatuagem de Dorff onde se lê Cleo, mesmo nome da personagem de Elle Faning.

Se há um cinema contemporâneo que sabe utilizar os conhecidos 'tiques' do que se convencionou chamar 'estética indie' a seu favor, Sofia Coppola dá um ótimo exemplo.
Nota: 9


Turnê

Filme pelo qual Mathieu Amalric foi premiado como melhor diretor em Cannes, Turnê tem um ritmo bem rock'n'roll, e me desculpem os puristas, mas ser rock'n'roll hoje em dia não é pra todo mundo e acho digno valorizar o termo enquanto adjetivo.

Viagens pessoais a parte, Turnê é bem agradável de ser visto, principalmente por causa das cenas de espetáculo, todas elas bem dirigidas e em alguns momentos reforçando a estética neoburlesca através da fotografia.

Figurino, maquiagem e trilha sonora super acertadas.

Nota: 8



Machete é desses filmes nascidos pra serem cultuados enquanto produto pop e isto não é um problema. A questão é que Robert Rodriguez se esforça tanto que esquece de se divertir, lição esta que ele deveria ter aprendido com o amigo Tarantino. O que torna inevitável a comparação entre os dois é justo a larga diferença entre a sensibilidade de ambos para moldar material tão parecido.

Divertido e sujo Machete inegavelmente é. Vale dizer que as melhores cenas do trailer fake que deu origem ao longa estão lá e Dani Trejo ganhou o papel pelo qual será eternizado. O apelo é fortíssimo e Lindsay Lohan interpretando o papel dela mesma é só uma das camadas de queijo extra desse sanduíche podrão. Risada garantida ou seu dinheiro de volta.
Nota: 7



Alguém precisa dizer ao Woody Allen que por mais que ele goste de filmar ninguém irá condená-lo por tirar um ano de férias. Depois de pensar que ele tinha recobrado o fôlego com Tudo Pode Dar Certo, o diretor pareceu meio preguiçoso desta vez: desenrolando burocraticamente o mesmo processo narrativo que costumamos associar ao seu cinema, Você vai conhecer o homem dos seu sonhos termina sem esmero e cheio de arestas.

A gente poderia ter ido dormir sem essa, hein Allen?
Nota: 6



A boa do festival foi ter conhecido o cinema de Apichatpong.

Tio Boonmee enquanto narrativa fantástica alcança com mérito o efeito de naturalizar o absurdo sem forçar a barra. Além disso é possível liga-lo à Somewhere no que diz respeito à afetividade com que são contadas as duas histórias: enquanto Sofia Coppola mergulha na subjetividade contemporânea, Apichatpong reincorpora o folclore ao cotidiano com doçura e muito respeito.

Acredito que o reconhecimento que Tio Boonmee vem recebendo diz muito também sobre a carência do cinema ocidental por novos modelos narrativos. Apichatpong não rompe com nada, mas apresenta os mesmos elementos de narrativa dispostos de outra maneira, e ainda que seja repetitivo citar isso duas vezes em dois parágrafos, o grande tempero é mesmo a afetividade.

Nada em Tio Boonmee parece ser burocrático e Apichatpong pareceu aquele velho aldeão que sabe manipular seus ingredientes fazendo a alquimia acontecer.
Nota: 10




terça-feira, 5 de outubro de 2010

Segunda-feira

Dia de filmes fora do comum:

Film socialism, Jean-Luc Godard
Acho importante começar dizendo que para mim Godard é o diretor que mais domina o fazer cinematográfico - não só entre os atuais, mas entre todos os que já assiste. Isso transparece em seus filmes e também textos. Godard é o tipo de realizador que não precisa mais provar o que quer que seja. Dito isso, essa parece ser a maior dificuldade do seu cinema atual: embora apoiado numa elaboração imagética rica e inventiva, ele é pouco "comunicativo" - e que fique claro que cinema não precisa de forma alguma ser comunicativo para ser bom.
Film socialism nos dá pouquíssimas portas para entrar em seu universo de discussão mesmo que jogue os elementos na nossa cara com veemência: a discussão da proliferação da imagem digital, as questões políticas da Europa contemporânea e as relações entre o público e o íntimo na imagem. Resta-nos mergulhar numa montagem vertiginosa por associação de imagens, jogos de palavras e sobreposições de ideias em constante deslocamento - aí o cenário de um transatlântico parece bastante pertinente. O filme torna-se mais "acessível" quando desloca-se para o conflito entre pais e filhos rodeado pela câmera intrometida de uma jornalista. De qualquer forma, continua sendo uma experiência única de cinema - mesmo com a sensação de estarmos assistindo do lado de fora.
Nota: 8

Ex isto, Cao Guimarães
Cao Guimarães é um diretor que geralmente opera entre os domínios do documentário e do experimental. Neste novo filme, ele agrega o registro ficcional - sem abrir mão dos outros dois elementos. É impressionante como o filme consegue passar de uma coisa à outra sem perder sua beleza e a sua unidade como narrativa. Seu ponto de partida é a livre adaptação da obra Catatau, de Paulo Leminski. Assim, temos Réné Descartes fazendo sua viagem imaginária ao Brasil - este bastante concreto. Primeiro, em uma certa relação com o país do passado: a floresta, os animais, a natureza. Depois, em plena cidade de Recife - nos trechos em que o curto-circuito de registros do filme chega ao seu ápice. Temos uma câmera que acompanha João Miguel encarnada de Descartes pela ruas da cidade e interagindo com as pessoas: personagens reais e o fictício interligados pelos acontecimentos captados pela câmera. O filme ainda passa por uma espécie de surto/performance belíssima de João Miguel, renascido pela experiência.
Nota: 9

Domingo

Outro dia de bons filmes!

Somewhere, Sofia Coppola
Um belo filme. Bastante singelo na forma de conduzir a narrativa. Muitas pessoas estão comparando ao Encontros e desencontros, embora tenha algumas situações parecidas, são filmes muito diferentes. Principalmente, por tratar da relação pai e filha. De qualquer forma, temos a marca dos filmes da Sofia: uma ótima trilha sonora de rock e personagens que não sabem bem o que fazer com aquela sensação de vazio. Talvez o ponto mais positivo seja a falta de pressa em desenvolver a narrativa. Desde o começo do filme, seu personagem principal, o ator Johnny Marco parece estar à beira de um abismo. Ainda assim, acompanhamos sua jornada lenta e cotidiana até lá - com uma leveza do que é insustentável.
Nota:9

Machete, Robert Rodriguez
Filme que nasceu do trailer da dobradinha Planeta terror e À prova de morte. Com certeza, é menos forte que os dois. Mas, ainda assim, é bastante divertido. Cinema debochado e cheio de explosões que tripudia de todos os clichês dos filmes de ação: cenas de luta impressionantes e escatológicas, um herói que conquista todas as mulheres ao redor, vilões caricatos, final previsível, etc.
Nota: 8.5

Carancho, Pablo Trapero
Apesar da boa direção, o filme se perde bastante em um roteiro que não faz muito sentido - não que todo roteiro precise fazer sentido, mas no caso de um filme denúncia da máfia de indenizações por acidentes de transito na Argentina era de se esperar que fizesse. Assim, ficamos entre o romance de um golpista da máfia com uma médica viciada em heroína e as intenções do filme em tratar do problema.
Nota: 7

domingo, 3 de outubro de 2010

Sábado

Esse sábado foi o dia do cinema asiático contemporâneo no meu Festival do Rio: China, Filipinas e Tailância em um mesmo dia.

Memória de Xangai, Jia Zhang-Ke
O diretor articula por meio de depoimentos a história recente de Xangai - sobretudo pós-Segunda Guerra Mundial. Dos closes nos rostos aos grandes planos da cidade, o filme é maravilhosamente belo. Junto com as entrevistas, existem os planos de uma mulher, quase fantasma, que se desloca pela cidade. Em muitos momentos, é difícil reconstruir historicamente os discursos - o que só torna o fluxo de memória mais intenso. Existe também um interesse forte pelas imagens - principalmente cinematográficas - que constituem essa memória recente. De certa forma, vemos a construção imagética de uma grande potência, a China, desde as suas guerras internas, passando pela Revolução Cultural. Junto com isso, acompanhamos como esse processo macro nacionalista atravessou, literalmente, a vida dos envolvidos.
Nota: 8.5

Independênica, Raya Martin
Filme bastante estilizado com várias formas de construção narrativa anti-naturalista: dos efeitos de cor na imagem em p&b à um corte brutal no fluxo da história para a inserção de um pequeno documentário falso, passando pelo cenários pintados ao fundo. É uma experiência de cinema interessante - embora, os efeitos nem sempre funcionem tão bem.
Nota: 8

Tio Boomnee,
Apichatpong Weerasethakul
O primeiro Apichatpong visto no cinema é inesquecível. Sem medo de soar repetitiva: é uma experiência de cinema imersiva e sensorial. Cinema-matéria. Fortemente enraizado no mundo natural, para contar uma história que o ultrapassa - ou penetra ou se mescla tão fortemente. Um pouco o curto-circuito de tempo e espaço cinematográficos. Enfim, melhor filme do festival até o momento.
Nota: 9.5

Sexta-feira

Reza a lenda que sempre existe aquele dia no Festival que a gente decidi não ver nada para descansar. Se isso é verdade para todo mundo ou não, não sei. Só sei que para mim esse dia foi a quinta - nem pisei no cinema...

Sexta-feira, já recuperada e com saudades da maratona foi dia de ver:

A casa muda,
Gustavo Hernández
Um filme de terror-dispositivo bem interessante - sobretudo a partir do seu final (podem deixar que não vou contar!). A câmera acompanha o tempo inteiro, com um plano-sequência que dura o filme todo, a personagem de Laura. Ela e seu pai estão passando a noite em uma casa abandonada, quando começam a ouvir barulhos e vozes estranhas. Daí para frente seguimos uma trama de cinema de terror clássica - até o final do filme.
Nota: 8

Em seguida, foi o momento de ver o documentário chilneno:
Nostalgia da luz, Patricio Guzman
O filme articula uma relação entre a astronomia, a arqueologia e os desaparecidos políticos do Chile no período Pinochet. Em comum, o deserto do Atacama - local fértil para a pesquisas científicas do solo e dos céus e também onde se desovaram muitas vítimas do regime militar. Constroi uma relação entre passado cósmico, pré-histórico e próximo bem interessanta. Mas, de certa forma, prende-se muito no formato clássico de documentário. O que deixa tudo isso um pouco cansativo.
Nota: 7

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Retrospectiva 1a semana do Festival do Rio

1- A Enseada - 8.0
2- Filho da Babilônia - 6.0
3- Buraco Negro - 5.0
4- Zona Sur - 3.0
5- Nossa Vida Exposta - 7.0
6- Copacabana - 7.0
7- A Mulher sem piano - 1.5
8- Cortina de Fumaça - 6.5
9- A Empregada - 8.0
10- Comer Rezar Amar - 7.0
11- Norberto Apenas Tarde - 7.0
12- Complexo: Universo Paralelo - 6.0
13- Sinto sua falta - 7.0
14- A Suprema Felicidade - 5.0
15- Federal - 0.0
16- Pó - 7.5
17- Viúva sempre as quintas - 9.0
18- Estigmas - 7.0
19- Terça depois do Natal - 9.0
20 - Aniversário de David - 6.5
21- A Encruzilhada - 7.0
22- Isto é o amor - 8.0
23- A Vida dos Peixes - 8.5
24- Amores Imaginários - 8.5
25- Kaboon - 8.5
26- Água Fria do Mar - 1.0
27- King's Road - 5.5
28- Essential Killing - 8.0
29 - Elvis e Madona - 5.0
30- Beijos - 7.0
31- Líbano - 9.0
32- Biblioteca Paschal - 7.5
33- Protektor - 6.5
34- Of God and Men - 8.0
35- Monstros - 4.0
36- Mine Vaganti - 7.5
37- Filme Inacabado - 8.0
38- Route Irish - 6.5
39- Invenção da Carne - 0.0
40- Minhas Mães e meu pai - 9.0

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Primeira semana de Festival do Rio chegando ao fim e esta colaboradora que vos fala com poucos filmes vistos. A grande chateação fica por conta da demora na confirmação de filmes como Tio Boonmee, de Apichatpong e Somewhere de Sofia Coppola, dois dos mais aguardados.
Mas nem tudo é problema e o festival já garantiu um grande momento: Helena Ignez apresentando o retorno do Bandido da Luz Vermelha às telas foi de uma emoção que eu nem saberia explicar de onde veio.

Tietagem à parte, vamos aos filmes:


Luz nas Trevas - A volta do Bandido da Luz Vermelha

Envolto numa disputa judicial que teoricamente o impediria de ser exibido, Luz nas Trevas começa com um jeitão de que não vai dar certo, mas acaba ganhando ritmo. Ney Matogrosso também vai crescendo durante o filme e chega a parecer confortável no final. Alguns diálogos trazem de volta a força de Sganzerla, mas o uso de cenas retiradas do primeiro filme sobre o bandido acabam reforçando a saudade de um cinema sujo, anárquico e marginal.
Nota: 7,5


Essential Killing

O filme mais recente de Jerzy Skolimowski - diretor polonês que ganha uma mostra só sua no Festival deste ano - foi crescendo na cotação do boca-a-boca e acabou sendo bastante visto.
Minimalista nos conflitos e gradiloquente na tensão, construída a partir de poucos elementos e quase nenhum diálogo, é daqueles filmes que te mantém preso à cadeira, alimentado à base de tensão e expectativa. Roteiro e narrativa não seguem a cartilha atual usada na fabricação de filmes comerciais, principalmente quando se fala em Afeganistão, tortura e perseguição.
Nota: 8,5


Kaboom

Conhecer o cinema de Greg Araki tornou-se a experiência mais divertida do festival até aqui. Quem for ao cinema esperando sentido em Kaboom vai acabar desarmado pela atmosfera descompromissada com o qual o diretor desenvolve a história de uma dupla de amigos metidos em uma sequência surreal de acontecimentos.
Bruxaria, pisicodelia, sexualidade e filmes de suspense em universidades. Mesmo esse plot não daria conta de explicar a bagunça criada por Araki, mas vale a pena assistir, nem que seja pelos figurinos.
Nota: 7,0


Pixo

Documentário sobre o universo da pixação na capital paulista chega às telas em momento oportuno, quando mais uma vez a Bienal de Artes de São Paulo ganha interessância a partir da presença de pixadores no evento, desta vez com credencial de convidados, sem que isso diminua o tamanho do barulho que eles são capazes de promover.
Além de acompanhar os rolês de pixo usando imagens captadas pelos próprios pixadores, o documentário levanta questões importantes sobre a diferença entre pixação e grafite e os conflitos envolvendo espaços de consolidação do bom gosto estético, como universidades e museus, em contraponto à uma atividade desmerecida e marcada pela marginalização.
Bom documento sobre a história recente de um movimento que tem poucas oportunidades de fala além da efemeridade de sua ação sobre a cidade.
Nota: 8,5


Malu de Bicicleta

Destaque entre os filmes brasileiros presentes no Festival e premiado em Paulínia nas categorias de melhor ator, atriz e diretor, o novo filme de Flávio Tambellini não empolga. Apesar de destacar-se das comédias românticas produzidas ultimamente no país, o filme não traz novidades pro gênero e é bastante econômico em fazer rir.
Apesar do elenco carismático, o roteiro não ajuda a produzir a empatia necessária e nem segura o suspense no qual Luiz (Marcelo Serrado) se vê aprisionado depois de se apaixonar por Malu (Fernanda de Freitas).
Nota: 6,0

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Quarta-feira

Mais dois bons filmes vistos hoje:

Terça depois do Natal, de Radu Muntean
O Felipe já falou bastante sobre o filme, alguns posts atrás. É realmente impressionante o naturalismo das atuações do filme. E como esse mecanismo é utilizado para criar uma proximidade entre a narrativa e os espectadores. Um pouco como se o filme se passasse numa sala ao lado, acessível e crível ao extremo. Também é notável como a história se equilibra entre a alegria da paixão e a tristeza do rompimento, sem cair em clichês ou no melodrama. Enfim, mais um belo filme do cinema romeno contemporâneo.
Nota: 8.5

O homem do lado, de Mariano Cohn e Gastón Duprat
Mais um bom filme argentino. É uma crítica, bem humorada, embora bastante cruel, dos
valores consumistas e estetas da classe-média alta argentina. Seu personagem principal é Leonardo, um famoso designer e professor, que mora com a mulher e a filha em uma casa projetada pelo arquiteto modernista Le Corbusier. O homem ao lado em questão é Victor, seu vizinho que resolve fazer uma janela com vista para a sala da valiosa casa de Leonardo. A princípio, acreditamos que esta é a razão para todos os problemas do designer. Mas, aos poucos, percebemos que a história não é necessariamente assim. A partir daqui é melhor não falar mais. Pois um dos trunfos do filme é jogar com os preconceitos e valores do espectador.
Nota: 8.5

Terça-feira

Agora parece que finalmente consegui engatar uma boa sequência de filmes no festival. Depois de Kaboom e Biblioteca Pascal, já foram mais quatro bons filmes. Terça foi dia da maratona de Carlos, do Olivier Assayas . Para conseguir encarar as cinco horas e pouco de filme, o jeito era pegar mais leve na programação. Então, antes dele só assisti:

Of gods and Men, de Xavier Beauvois
Este é um desses filmes que a gente começa a assistir sabendo exatamente o que vai acontecer e isso não diminui nem um pouco o prazer de assisti-lo. Ao contrário, até faz com que aproveitemos melhor sua narrativa lenta e a repetição cotidiana dos planos. O filme se passa num mosteiro da Argélia, em que a princípio convivem em paz monges franceses e a comunidade mulçumana. Mais do que em paz: em cooperação - eles prestam serviço de atendimento médico e frequentam as festas mulçumanas a que são convidados, e alguns moradores trabalham dentro do mosteiro fazendo pequenos serviços. No entanto, essa harmonia é quebrada com a ascensão do terrorismo religioso interno no país: pessoas começam a ser mortas por não usarem o véu ou apenas por serem estrangeiras. Os monges precisam então tomar decisões fundamentais, que envolvem não só a sua segurança pessoal, como a relação da comunidade e a sustentação da sua fé e das doutrinas do catolicismo. O que fazer: ir embora do país? Aceitar a segurança armada do exército? Prestar atendimento médico de emergência aos terroristas? São algumas das questões colocadas pelo filme. O que impressiona é a sutileza e a paciência com que as decisões são filmadas. Uma verdadeira declaração de fé nas imagens e na sua potência.
Nota: 9

Enfim, depois veio:

Carlos
, de Olivier Assayas
Talvez uma das palavras mais apropriadas para descrever esse filme seja imensidão: do tamanho do filme à abrangência histórica do seu personagem, passando pela ambiciosa construção de cinema em torno - tudo no filme é imenso! Existe, em um cinema mais recente, esse desejo de contar a história dos movimentos guerrilheiros/terroristas/esquerdistas do anos 1960 e 1970. De filmes mais ingênuos, como Munique, do Spielberg, a documentários como o Advogado do Terror (o personagem de Jacques Vergès inclusive aparece no filme de Assayas defendendo Magdalena Kopp) ou a ficção alemã O Grupo Baader Meinhof, de Uli Edel, os exemplos de multiplicam.
Não que o objetivo do filme de Assayas seja contar exatamente a história destes grupos ou do terrorismo. Mas seu desejo de construir o personagem de Carlos passa necessariamente por essa história. Uma história que não deixa de ser a de um grande fracasso político, de perda de utopias e de capitalização absoluta do mundo e das relações interpessoais. E que também tem o seu começo no movimento contrário: na explosão de desejos sobre o mundo e sobre os corpos. Dois movimentos que Assayas capta maravilhosamente. A imagem da potência está lá: com Carlos nu, diante do espelho, depois de cometer seus primeiros atentados. E a decadência desse corpo é mesmo física: seu corpo doente sobre uma cama de hospital é finalmente capturado.
Enfim, um exercício de cinema belíssimo que vale suas muitas horas.
Nota: 9

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Segunda-feira

O dia começou com dois filmes fracos e com bastante em comum. Tanto o argentino O que mais quero, de Delfina Castagnino, quanto o filme da Costa Rica Água fria do mar, de Paz Fábrega, parecem apostar em um cinema de narrativa simples e de poucos recursos técnicos. O problema dos dois filmes é que eles não apresentam nada de interessante para sustentar esse projeto de economia estética. São filmes plasticamente feios e com enredos que não acontecem. Que de certa forma nos deixam com as perguntas de: para que estes filmes foram feitos? Qual era o desejo que movia seus realizadores? Eu confesso que fiquei sem respostas.

O que mais quero, de Delfina Castagnino
Nota: 5
Água fria do mar, de Paz Fábrega
Nota: 4

Mas a magia do Festival do Rio é a de nos surpreender positivamente quando nossa esperança de ver bons filmes parece estar se apagando.

Kaboom, de Gregg Araki
Eis um filme bastante incomum. Uma mistura de comédia, com suspense, com romance adolescente e, ao mesmo tempo, nada disso exatamente. Entre seitas, bruxas, conspirações e muito sexo, o filme vai construindo uma história cada vez mais maluca – e, por isso mesmo, cada vez mais maravilhosa.
Nota: 8.5

Biblioteca Pascal, de Szabolcs Hajdu
Este filme é uma espécie de fábula da Europa globalizada: a personagem principal é uma mulher de origem húngara, que mora na Romênia, passa pela Alemanha e termina em Londres – para, finalmente, regressar à casa. Toda essa saga é contada com muito lirismo e magia. Ainda que o filme reserve um momento para o choque com a realidade e a desconstrução de seus mecanismos, a força da sua personagem é a de preferir continuar a re-escrever, na medida do possível, sua própria história poeticamente.
Nota: 8.5

Domingo

O dia foi de poucos filmes, apenas dois - afinal, de vez em quando a gente tem de parar um pouco para organizar a vida. O primeiro foi a estreia de:

Agreste, de Paula Gaitán
Se existe um tipo de crítica quase impossível de se fazer é sobre filmes experimentais - e exatamente o caso desse. Mais do que em qualquer outro domínio do cinema, o experimental passa por uma relação direta entre os elementos fílmicos e a experiência do espectador. Em outras palavras, ou a gente compra a viagem de quem fez ou filme ou fica aquela sensação de quem está de fora do jogo de imagens. Nesse filme da Gaitán em alguns momentos essa cumplicidade foi possível: adentramos a um universo feminino de aridez. Mas aos poucos as experimentações começaram a parecer repetitivas e o filme tornou-se exaustivo - quase interminável. Não deixa de ser louvável, de qualquer forma, a construção desse universo e plasticidade imagética e sonora do filme.
Nota: 7

E a noite terminou com a sessão lotada de:

Amores imaginários, de Xavier Dolan
Dolan é o típico diretor faz-tudo: do roteiro ao figurino, da montagem a trilha sonora, ele participa de todas as etapas dos seus filmes. Ele é também tipicamente antenado: vemos desfilar na tela os melhores modelitos modernetes e cortes de cabelo indies, musiquinhas francesas engraçadinhas, os planos e tiques de câmera do cinema contemporâneo. O problema é que essa conjunção torna o seus filmes uma espécie de pot-pourri desgovernado de influências. E aí sobra pouco espaço para a personalidade - o que não deixa de ser uma pena, porque por trás de tantas afetações Dolan tem até boas ideias.
Nota: 5

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Festival do Rio - Dia 3 (parte 1)

21- O Aniversário de David (Il Compleanno, 2010, Itália)

Matteo (Massimo Poggio) é um analista bem sucedido, de 40 anos, casado com Francesca (Maria de Medeiros, e que por ter tido uma infância difícil, nunca se permitiu ser irresponsável, ou "vagabundo", como ele mesmo coloca. Sempre se obrigou a estudar e trabalhar para conseguir os seus objetivos sem depender dos outros, e com isso criou um complexo de superioridade. Matteo vive aparentemente bem, devotado ao trabalho, a esposa e a filha, até que durante as férias de verão, conhece o filho de um casal de amigos, David, um modelo com conteúdo, despertando o seu interesse até então adormecido.

A ação do filme se passa exatamente nessas férias de verão, onde os dois casais, com seus filhos, alugaram uma casa numa praia da Itália. A relação é muito bem estabelecida e envolvente, mas conforme as fachadas vão ruindo e os relacionamentos se deteriorando, a direção carrega um pouco no drama e o filme fica bem menos interessante. O fato do ator brasileiro iniciante Thyago Alves (um cover do Jesus Luz, e que interpreta David) ser jogado no meio de um elenco afiado e experiente, só ajuda a quebrar ainda mais a história do meio pro final. Ainda assim, Poggio e Medeiros sustentam o interesse na trama até o final, que é muito mais dramático do que deveria e com uma solução fácil demais, quase preguiçosa. Uma pena, mas não é de todo ruim.

Nota: 6.5

22- A Encruzilhada (Kavsak, 2010, Turquia)

Uma boa surpresa a Turquia. O filme acompanha a vida de diversos personagens que se cruzam ao longo da trama. Eu sei, seu sei, essa é a trama de Crash, Magnólia, e tantos outros filmes, mas aqui ocorre sem exageros. Guven trabalha em uma empresa de contabilidade, e não participa de nenhuma atividade social alegando que sua mulher e filha são muito apegadas, mas na verdade ele mora sozinho. Seu segredo é ameaçado quando uma companheira de trabalho, Arzu, se muda para a sua sala e percebe incongruências na sua história. Ela mesma está passando por um divórcio difícil e tem que se dividir entre o trabalho, a filha, e o ex-marido alcólatra. No trabalho, um jovem que precisa desesperadamente de dinheiro pra ajudar a irmã que está no hospital, chantageia Guven para encobrir um desvio de dinheiro.

O filme poderia passar desapercebido não fosse a grande eficiência do elenco, que transformam essa história, que poderia ser pesada e melodramática em uma coleção de personagens interessantes. Não simpatizamos com Guven no princípio, mas a interpretação de Güven Kiraç é comovente, e conforme vamos conhecendo os detalhes que o levaram a mentir sobre a família, e o que realmente aconteceu com eles, vão conquistando o expectador, pouco a pouco. O mesmo pode ser dito sobre Sezin Akbasogullari, que a princípio tem toda a simpatia e pena por ser mãe divorciada de um alcólatra que resiste em deixar a família de lado, mas que ao remexer na vida do colega de trabalho, tentando esquecer seus próprios problemas, vai ganhando dimensões bem menos óbvias.

O roteiro tem alguns deslizes e forçações de barra, mas é um bom filme, graças a direção segura e ao ótimo elenco.

Nota: 7.0

23- Isto é o amor (This is love, 2009, Alemanha)

Meu primeiro filme alemão do Festival, que em outros anos tanto me trouxe alegrias. E apesar desse título, o filme passa longe de ser uma comédia romântica, ou até mesmo um romance no sentido mais convencional da palavra.

Corinna Harfouch interpreta Maggie, uma policial que foi abandonada pelo marido sem nenhuma explicação 16 anos atrás, e desde então se afastou da filha e se tornou uma alcólatra. No trabalho, se depara com o caso de Chris (Jens Albinus), um homem que tentando ajudar uma menina vietnamisa a encontrar uma família, acabou arranjando mais problemas do que poderia resolver, e que foi preso ao tentar se matar jogando seu carro contra um caminhão. Maggie vai ter que tentar elucidar o que aconteceu com a menina enquanto lida com seus próprios demônios.

Assim como a memória de um bêbado, vamos entendendo aos poucos como Maggie chegou naquela situação, onde parece não se importar com trabalho, com a filha, e é um fantasma do que foi um dia. Ela chega a dizer que a sobriedade é uma alucinação gerada pela abstinência de bebida alcólica. Ao mesmo tempo, vamos entendendo o que se passou na vida de Chris, que se recusa a contar sua história inteira, comer, beber água, e pergunta constantemente a quanto tempo está preso. São dois personagens interessantíssimos e bem construídos, não são fáceis de se relacionar, ou sequer de gerar qualquer empatia. A relação de Chris com a menina vietnamisa Jenjira é sempre dúbia, o que nos leva a não confiar plenamente nele, nem nela. Já Maggie é ainda mais complicada, já que nenhuma de suas atitudes nos levam a simpatizar com ela. Mas conforme o desenrolar da história, percebemos que nada é tão simples, ninguém é tão bom ou mal. E o final é bastante forte e reflexivo. Certamente um dos que valem a pena conferir no Festival.

Nota: 8.8

domingo, 26 de setembro de 2010

Festival do Rio - Dia 1 e 2

17- Pó (Dust, 2009, Luxemburgo / Áustria)

Um bonito filme, que me surpreendeu, mesmo que não tenha me cativado completamente. O filme conta a história de um casal de irmãos gêmeos que vivem sozinhos numa casa afastada, dentro do seu próprio mundo, e tudo muda quando eles encontram um homem baleado. A inserção do terceiro elemento vai modificar a forma como eles se relacionam, colocando regras sociais e afetivas que antes não importavam dentro desse mundo. A fotografia e a direção são extremamente eficientes ao criar esse mundo livre, com seu próprio tempo, sua própria luz. Vale a pena ver.

Nota: 7,5

18- Viúvas sempre as quintas (Las Viúdas de los jueves, 2010, Argentina / Espanha)

Esse é um dos grandes filmes do Festival até agora. O cinema argentino sabe contar uma história com eficiência, principalmente com um diretor do calibre do Marcelo Piñeyro. Seus últimos três filmes, Plata Quemada, Kamchatka e O que você faria? já demostravam a sua habilidade em construir uma narrativa bem feita, e Viúvas segue o mesmo caminho. O elenco aqui também é maravilhoso, destaco o sempre ótimo Leonardo Sbaraglia. A história se passa em um condomínio de luxo, pouco antes da crise econômica que atingiu a Argentina em 2001. Quatro casais tem suas vidas descontruídas entre dois momentos, com a narrativa pouco a pouco desenvolvendo os personagens e preenchendo as lacunas da história. Enfim, ótimo roteiro, atuações, direção, trilha, edição. Imperdível no Festival.

Nota: 9.0

19- Estigmas (Estigmas, 2010, Espanha)


Filme interessante, com uma fotografia em preto e branco muito bonita. A história é sobre um ex-presidiário de bom coração, alcólatra, que determinado dia acorda com feridas nas mãos que lembram as chagas de cristo. Sem saber como elas surgiram, e como elas não cicatrizam, algumas pessoas o vêem como um santo, enquanto outros sentem repulsa. O filme acaba desandando um pouco no terceiro ato, mas a história é interessante, baseada em um quadrinho espanhol, e tem ótima atuação de Manuel Martinez, que parece um urso, mas passa toda a candura que o personagem precisa com o seu olhar.

Nota: 7.0

20- Terça depois do Natal (Marti, Dupa Craciun, 2009, Romênia)

Outro grande Destaque do Festival, e esse possivelmente nunca vá estrear no Brasil, o que é uma pena. O cinema romeno, que chamou a atenção do mundo com 4 meses, 3 semanas e 2 dias alguns anos atrás, faz mais um filme envolvente e forte. A direção de Radu Muntean é possivelmente uma das melhores que assisti até agora. Os planos sequências sabem ser naturais, e dão a sensação de estarmos presentes, nos apaixonando quando preciso, nos comovendo, presenciando as discussões e sofrendo com os personagens. Que esses planos são bonitos, difíceis, causam admiração, não é novidade. Mas aqui eles são muito mais do que isso, eles são orgânicos, como se não houvesse outra forma de se contar essa história.

Paul (Mimi Branescu, maravilhoso) é casado com Adriana (Mirela Oprisor, perfeita), com quem tem uma filha, mas mantêm um caso com a dentista Raluca (Maria Popistasu). Quando as duas ficam cara a cara no consultório, Paul percebe que vai ter que escolher entre uma das duas. Eu sei que a premissa não promete muito, mas os diálogos e a forma como o roteiro vai trabalhando esses personagens, suas expectativas, suas relações, é arrebatador. O elenco todo está mais do que perfeito, auxilidados por um ótimo roteiro e um diretor que sabe muito bem o que faz.

Nota: 9.0

Se tivéssemos um placar, diria que Romênia e Argentina estão 1x1. E o Brasil está -2, o que é uma pena, num Festival do Rio.

Sábado

A programação era começar o dia com:

Ao mar, de
Pedro Gonzalez-Rubio
Um excelente documentário obser
vacional. Acompanhamos a visita de Natan, um menino de 5 anos que vive em Roma com a mãe, ao seu pai Jorge, um mexicano de origem maia. Jorge é pescador e vive com o pai em uma palafita no meio do mar. Assim, temos a experiência infantil de conhecer um novo universo, inteiramente diferente, e de construir uma relação com o pai. A câmera do filme é impressionante, sempre acompanhando os acontecimentos, mas mantendo-se quase completamente invisível.
Nota: 8,5

Depois, fui conferir a adaptação chinesa do Gosto de sangue, do Coen:
A Woman, a Gun and a Noodle Shop, de Zhang Yimou
Por enquanto, o filme mais di
vertido que vi no festival. Os cenários e figurinos são bastante estilizados - o que combina com a comédia pastelão de jogos de erros. O jogo narrativa entre o que o espectador e os personagens sabem é muito bem sucedido: estamos sempre um passo a frente, vendo-os cometer uma trapalhada atrás da outra.
Nota: 8

A ideia era terminar o dia com o documentário iraniano, A gente acaba se acostumando, de
Mohsen Ostad Ali Makhmalbaf. Mas o filme foi substituído de última hora e não passou.

Sexta-feira

Agora começou oficialmente o festival do Rio e a correria de filme em filme. Este ano me propus a manter a média de três por dia - mas as alterações de última hora da programação já me deixaram devendo um ontem a noite...

Na sexta, a programação foi de uma dobradinha nacional no Odeon:

180º, de Eduardo Vaisman
O filme é interessante. Tem um roteiro bem arquitetado, uma montagem inventiva e boas atuações do trio de atores. Mas peca constantemente por não acreditar na inteligência do espectador - o que é fundamental em uma narrativa que envolve mistérios e suspense. Assim, faz questão de mostrar e explicar mais do que o necessário. Também de pontuar os momentos de virada na trama com uma trilha sonora óbvia. Ainda assim, o final consegue segurar as pontas da história.
Nota: 6

Luz nas trevas, de Helena Ignez e Ícaro C. Martins.
O filme é uma homenagem ao Bandido da luz vermelha - e, nesse sentido, funciona bem. Ficamos com o gostinho de saudades daquele cinema ousado do Sganzerla. Mas como um filme sozinho, Luz nas trevas não sobre muito bem. De certa forma, é como se sua linguagem tenha ficado obsoleta e não de conta da narrativa que tenta contar.
Nota: 7

E a noite terminou com o sensacional:
Essential Killing, de Jerzy Skolimowski
Atuação impressionante de Vincent Gallo. É um desses filmes viscerais, que você sente frio, calor, fome, medo com o personagem. Com certeza, meu primeiro destaque na programação.
Nota: 9

Festival do Rio - Dia 1

O Festival do Rio enfim começou, e a sessão se abertura foi o novo filme do Arnaldo Jabor, A Suprema Felicidade.

14- A Suprema Felicidade (2010, Brasil)

Arnaldo Jabor parece preso nos anos 70 e 80, quando fazia filmes como Eu sei que vou te amar, Eu te Amo, O Casamento, Toda Nudez será castigada. Depois de quase 20 anos sem dirigir nada, ele enfim volta com este A Suprema Felicidade, que sinto dizer, é bastante irregular. O filme mostra 3 diferentes épocas do protagonista, a infância, adolescência e juventude, e como ele se relaciona com família, amigos, amores. O problema é que o filme não tem nenhuma coesão. Os pais, interpretados por Mariana Lima e Dan Stulbach, aparentemente estão numa peça de teatro e esqueceram que era para ser um filme. Se serve de concolo, a direção de arte da casa em que eles vivem, e principalmente os diálogos, só nos fazem sentir mais ainda a teatralidade. Me irritou profundamente os "diálogos" onde personagens, com olhos marejados, olham para a distância e começam a recitar o roteiro como se fosse um monólogo, para em seguida lembrar que deveria estar falando com outra pessoa. Ainda assim, o filme tem um grande trunfo, que é Marco Nanini. Enquanto ele está em cena, quase perdoamos os outros defeitos. Jayme Matarazzo foi uma boa surpresa, ele está bem o suficiente pra nos manter interessados no filme, mesmo quando não achamos nenhuma função para personagens secundários. Meia hora a menos e uma enxugada do roteiro fariam maravilhas por esse filme.

Nota: 5.0

15- Federal (2010, Brasil)

Já esse filme nacional não tem desculpa nenhuma. De longe, o pior do Festival, quiçá do ano. Não existe nenhuma desculpa para esse filme ter sido feito, para que o elenco, que conta com Michael Madson (Cães de Aluguel, Kill Bill) e Selton Mello, tenha aceitado entrar numa furada sem tamanho como essa. O roteiro é ridículo, as atuações são canhestras, a iluminação é primária, e principalmente, a direção é amadora. Não sei quem disse pra Erik de Castro que ele tinha o que era preciso pra fazer um filme de ação policial, mas essa pessoa mentiu. Não tem um plano que valha a pena, e assistir esse filme me deu vergonha alheia por todos os envolvidos. Não é a toa que o filme foi rodado em 2006 e só agora está passando em um Festival do Rio, e nunca entrando em cartaz. Se tem algum filme que merece ficar na lata e nunca sair, é esse. Ou façam um drinking game, uma dose de tequila a cada vez que o diretor fizer um plano deselegante, todo mundo bebe. Eu detestei o filme nesse nível, a querer que voltem a vender bebida alcólica nas salas de cinema.

Nota: 0.0

16- Casa de Ferreiro Espeto de Pau (108 Cuchillo de Palo, 2010, Espanha)

Documentário sobre o tio da diretora Renate Costa, Rodolfo, que supostamente morreu "de tristeza" quando ela era pequena. Ao pesquisar a vida dele, Renate descobriu que o tio era homossexual e fora preso durante a ditadura paraguaia. É interessante ver como ela vai redescobrindo o tio, e como sua imagem era apagada pela família preconceituosa. Tão interessante quanto ver como Rodolfo vai se desvendando, é a relação de Renate com seu pai homofóbico, e em como ele acredita piamente que fez a coisa certa ao não aceitar o seu irmão. Também é chocante acompanhar os detalhes da tortura da ditadura, que não apenas prendia os homossexuais como criavam uma lista com o nome de todos eles e pregavam nas paredes de Igrejas, bancos, mercados, para que eles passassem por uma humilhação pública e moral além das físicas impostas na cadeia. Um bom documentário.

Nota: 7.5

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Preliminares do Festival do Rio - Dia 4

Dia cansativo de alegria nos bastidores do Festival do Rio. Depois de muito atraso, enfim saiu a revista impressa que contém as sinopses e a programação. Muitos cinéfilos esperavam por isso pra fazer sua agenda pras próximas duas semanas (eu incluído). Agora tem que ter paciência e um grande poder de organização pra encaixar todos os filmes (ou a maioria) e torcer pra não deixar passar nada fundamental sem ser visto (coisa impossível). Com minha ampla experiência de anos anteriores, sei que só funciono com uma agenda e muitos post its. A agenda do Mac e do Iphone certamente são um a mais nessa hora. Agora vamos aos filmes de ontem:

10- Comer Rezar Amar (Eat, Pray, Love, 2010, Estados Unidos)

Eu sei, esse não é um típico filme de Festival, aliás o filme vai estrear antes que o evento acabe. Mas já que teve cabine, tá tudo valendo. O filme é o segundo do diretor Ryan Murphy, (de Correndo com Tesouras) que é também o criador das séries Nip/Tuck e Glee. Baseado no best-seller de mesmo nome, o roteiro conta a história biográfica de Elizabeth Gilbert, uma escritora que decide abandonar seu casamento e viajar pela Itália, Índia e Indonésia, buscando o prazer pessoal, espiritual e o equilíbrio entre essas duas coisas. É um alívio enorme ver um filme voltado pro público feminino que não seja sobre uma mulher pós-moderna, dedicada exclusivamente ao trabalho, e que não consegue achar um homem. Comer Rezar Amar é muito mais sobre o desprendimento, sobre o desapego, auto-conhecimento, reflexão, perdão. É claro que no processo ela vai se envolver com Billy Crudup, James Franco, Javier Bardem... Mas ainda assim, esse não é o foco do filme. E como não poderia deixar de ser, é um filme da Julia Roberts. Quem ama ela vai continuar amando, quem não ama vai querer furar os tímpanos cada vez que ela gargalhar. Mas é inegável que essa é sua melhor interpretação desde Closer. O filme tem alguns problemas de ritmo. A parte da Índia, cujo foco principal é a meditação, é a menos interessante. Murphy não conseguiu capturar o humor da autora nessa parte, nem do personagem de Richard Jenkins. E o relacionamento com Bardem não é tão bem desenvolvido quanto merecia, mas depois de 2h30 de filme, era difícil esperar mais. Ainda assim, o desenvolvimento do personagem é interessante, e pra quem não esperar uma comédia romântica, e sim uma jornada de auto conhecimento, vai curtir o filme.

Nota: 7.0

11- Norberto Apenas Tarde (Norberto Apenas Tarde, 2010, Uruguai / Argentina)

A Kenia já apresentou o filme aí em baixo, então não vão falar tanto sobre a história. Só acho válido comentar que o diretor é o Daniel Heddler, mas conhecido por ser o ótimo ator de Abraço Partido e Direitos de Família. O filme não chega a ser maravilhoso, mas o personagem do Norberto é interessante na sua forma de lidar com as mudanças, em como ele se antecipa a elas, mas não lida muito bem com isso. Não é tão bom quanto os filmes do Daniel Burman, mas é uma estréia promissora pro Hendler. Comparado a estréia do Gael García Bernal então, um filme chamado Déficit que passou aqui no Festival de 2007, o cara é um gênio! Deu pra perder um pouco do trauma de atores latinos na direção.

Nota: 7.0

12- Complexo: Universo Paralelo (2010, Brasil)

Inevitável pensar ao entrar na sala: Mais um documentário sobre favela. Infelizmente, o pensamento não muda muito ao sair. No início, somos avisados por uma cartela que os diretores são dois irmãos portugueses que passaram um tempo no Complexo do Alemão e documentaram essa estadia entrevistando os personagens do filme. Cartela inútil, pois em momento algum é utilizado o fato de ser uma visão estrangeira. Ainda assim, algumas das imagens inseridas são bem fortes, e os depoimentos, por mais que não acrescentem muito ao tema, tem momentos interessantes.

Nota: 6.0

13- Sinto sua Falta (Te extraño, 2010, Argentina / México)

Também não vou entrar em detalhes pois a Kenia já fez um ótimo trabalho discursando sobre ele. Confesso que prefiro Kamchatka quando o assunto é ditadura Argentina, mas eu acredito que é um tema que ainda pode render bons frutos. Sinto sua falta não é excepcional, também não acrescenta muito ao tema, mas a relação entre os personagens é inteligente o suficiente pra manter o interesse no filme. A Argentina sabe muito bem desconstruir uma família, o que só me deixa mais curioso pelos próximos filmes da Mostra dedicada a eles.

Nota: 7.0

Foco Argentina

Norberto Apenas Tarde (2010, Uruguai/Argentina)
Sinto Sua Falta (Te Extraño, 2010, Argentina /México)

Este ano o Festival do Rio dará um destaque especial à produção do cinema Argentino. Cerca de 20 filmes da cinematografia recente do país serão exibidos e alguns dos seus diretores estarão presentes no Festival. A produção dos hermanos consegue, em geral, sustentar uma qualidade muito boa. Não que todos os filmes sejam excelentes ou, muito menos, sejam todos iguais. Mas a competência e a regularidade dos filmes do nosso vizinho sul-americano é considerável – assim como, um certo olhar pessimista, ainda que insistente, sobre o mundo.

Hoje assisti à “Norberto apenas tarde”, estreia do ator Daniel Hendler na direção, e “Sinto sua falta”, de Fabián Hofman. Os filmes são bastante distintos: um se passa no Uruguai atual e o outro, na Argentina dos anos 1970; o primeiro é sobre as dificuldades da vida adulta e o segundo, sobre as questões da juventude. Em comum, no entanto, a passividade dos corpos diante das questões políticas e sociais.

“Norberto apenas tarde” é a história de um uruguaio comum: na casa dos 30 anos, branco, de classe-média, empregado, casado – enfim, Norberto começa o filme com a vida resolvida. No entanto, algo rui essa calmaria: sem alarde, sem grandes acidentes, ele resolve mudar de vida. Aos poucos, abandona todos os pilares que o sustentam: troca de emprego, entra no teatro, passa a ter problemas com a mulher. Uma das grandes qualidades do filme é a de filmar essas transformações gradativamente: como uma bola de neve que começa pequenina e leva muito tempo até a tomar um formato gigantesco. A outra é a de não querer psicologizar o que acontece com Norberto: não existem explicações nem, tão pouco, planos para o futuro. Existem pequenas ações que engendram outras, quase involuntariamente. É assim que percebemos que o poderia ser uma utopia de libertação, não passa de uma fábula do não lugar contemporâneo. Isso fica claro, sobretudo, quando o corpo cansado e inerte de Norberto é filmado na presença dos companheiros bem mais jovens da aula de teatro. Como se diante da jovialidade que lhe escapa pelos dedos, já fosse “apenas tarde”.

Nota: 8

Em “Sinto sua falta”, ao contrário, o protagonista é o jovem Javi, em seus 15 anos. Ele ainda não tem a vida ganha de Norberto, embora seja de uma família abastada. Seu corpo ainda é capaz de apaixonar-se e mover-se a mercê das curiosidades e dos encantos da adolescência. O problema é que Javi vive na Argentina dos anos 1970 e vê estourar na sua frente o Golpe Militar do país. Se já não fosse pouco, ele possui um irmão mais velho e militante em uma organização de esquerda. As consequências desses fatores é óbvia e o rapaz é levado pelos país a um exílio voluntário no México.

“Sinto sua falta” é mais um dos inúmeros filmes sul-americanos sobre as ditaduras militares que assombraram os países dos anos 1960 a 1980. A recorrência temática sempre parece uma forma de reviver o trauma histórico que ainda não foi bem resolvido. Nesse sentido, há uma cena bastante sintomática no filme, na qual Javi reencontra sua avó paterna, que oscila momentos de sobriedade com um início de senilidade. A princípio ela o reconhece mas, pouco tempo depois, confunde-o com o seu irmão. É o necessário para acabar com a fingida tranquilidade familiar e trazer a tona as feridas abertas. Eis a encenação metafórica da relação entre o cinema da América do Sul e o seu passado recente. A Javi impotente diante das conjunções políticas resta resignar-se e seguir em frente.

Nota: 7

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Preliminares do Festival do Rio - Dia 3

Depois de tirar o domingo de folga, hoje voltei pras cabines do Festival, enquanto monto minha programação pras próximas duas semanas. São muitos filmes, e como todo bom cinéfilo, tenho que tentar balancear os filmes que quero muito ver, mas sei que vão estrear, com as coisas mais obscuras que certamente nunca virão novamente pro Brasil, mas que em compensação, muitas vezes não valem a pena. Festival é um pouco isso, achar aquela pérola, que você só vai ver por ali. O que não significa que eu não vá ver o filme novo da Sofia Coppola. Mas vamos aos filmes do dia:

7- A Mulher Sem Piano (La mujer sin piano, 2009, Espanha/França)

Definitivamente o pior filme que eu vi até agora. Além de chato, os personagens são totalmente desprovidos de carisma, a fotografia é óbvia, qualquer tema que o filme tente abordar fica totalmente superficial. O diretor Javier Rebollo até tenta criar uns planos mais interessantes, mas é tudo meio lugar comum. As atuações são boas, mas como a história não engata, o elenco não tem muito o que fazer. O roteiro ruim é sobre uma depiladora/dona de casa que tem uma vida enfadonha, e certa noite decide fugir, arruma uma mala e vai pra uma estação de trem. A trama se desenrola (ou não, depende do ponto de vista) no decorrer dessa noite, onde ela vai conhecer umas figuras estranhas, e vai se conhecer um pouco mais também. Uma espécie de crítica pra sociedade, pra tv, pra guerra, pra frieza do ser humano num mundo pós moderno, e nada aprofundado.

Nota: 1.5

8- Cortina de Fumaça (2009, Brasil)



Primeiro filme brasileiro do Festival. Cortina de Fumaça é um documentário sobre a legalização das drogas, as políticas governamentais de proibição, sobre os efeitos do consumo e as consequências de todas essas questões para a sociedade. Em primeiro lugar, tenho que deixar claro que o filme é bem tendencioso. Todas as entrevistas apontam pro mesmo lado, proibir é ruim, utilizar não é tão prejudicial quanto a mídia gosta de mostrar. Acho o documentário ingênuo também ao colocar as informações sobre as drogas são sempre as mesmas. Num mundo com internet, tv a cabo e afins, quem quer se aprofundar no tema consegue facilmente, e só fica com a informação senso comum quem quer. O debate da legalização não está no primeiro passo. Ainda tem muito o que se discutir com a sociedade, mas não se pode dizer que esse tema é totalmente inédito. Ainda assim, o filme tem depoimentos muito interessantes, e alguns argumentos que acrescentam bastante à discussão sobre as drogas e as políticas públicas que eles tanto recriminam. Vale a pena ver.

Nota: 6.5

9- A Empregada (Hanyo, 2010, Coréia do Sul)

Esse filme quase pode ser considerado uma pérola do Festival. Dificilmente vai estrear por aqui, e é um melodrama asiático muito bom. Acho que o final, embora condizente com o decorrer do filme, fica um pouco pesado demais. Mas no geral, o filme cumpre bem o seu papel. O elenco feminino particularmente me impressionou bastante. A história (peguem os lenços) é sobre uma empregada boazinha que é seduzida pelo patrão milionário, causando a ira da esposa traída, grávida de gêmeos, e da sogra malvada. Pra piorar a situação, a empregada fica grávida, e as mulheres da família não vão querer deixar o beber nascer. Eu sei, falando assim não parece nada demais, mas a direção é muito boa, os planos são belíssimos e exagerados, o roteiro, apesar de carregado, tem alguns momentos leves, e a história é boa o suficiente pra nos manter fisgados até o fim.

Nota: 7.5

domingo, 19 de setembro de 2010

Preliminares do Festival do Rio - Dia 1 e 2

Então pessoal, vamos postando por aqui os filmes que formos assistindo no Festival do Rio pra que vocês possam acompanhar nossa cobertura. Espero que gostem!


1- A Enseada (The Cove, 2009, EUA)

Injusto começar o Festival assistindo um documentário vencedor do Oscar, né? Já eleva as expectativas lá pro alto e tenho pena do filme que seguir esse. Mas eu normalmente me preocupo em começar e terminar bem, porque mesmo que tenha um monte de merda no meio, eu vou sempre ficar com uma boa impressão do Festival. A Enseada, pra quem não sabe, é um documentário sobre a matança de golfinhos no Japão. Eles mostram como os japoneses utilizam um sistema de sons pra encurralar golfinhos numa enseada escondida, lá selecionam os que parecem com o Flipper pra mandar pra parques aquáticos, tipo Seaworld. Os outros, incluindo bebês golfinhos, são massacrados com uns arpões gigantes, numa cena fortíssima, triste demais, onde a água da enseada fica totalmente vermelha com o sangue dos golfinhos. Acho que a retórica do filme não é perfeita, não acho que eles tentem o suficiente entrevistar os japoneses, nem apresentar argumentos muito válidos pra combater o que os japoneses dizem. Por exemplo, quando as autoridades falam que eles matam golfinhos porque eles estão acabando com os peixes e está atrapalhando a atividade pesqueira, eles mostram uma ou outra delegação (incluindo a brasileira) de um congresso que eles mesmo admitem ser ineficientes, dizendo que isso esse argumento é ridículo. E provavelmente é, mas custava colocar um estudo, uma estatística, ou um pesquisar sério? Ou quando eles querem comprovar que comer golfinho não é uma questão cultural japonesa, eles vão pras ruas de Tokio e mostram umas 4 ou 5 pessoas falando que nunca comeram golfinho. Isso lá é forma de pesquisa? Mas a verdade é que as imagens com os golfinhos são tão fortes, e a forma narrativa como nós vamos sendo preparados pra isso é tão eficiente, que o melhor argumento que eles poderiam fazer é exatamente mostrar aquelas imagens. Nada parece ter explicação ou justificativa plausível depois daquilo. É um bom documentário-denúncia. Só nos resta torcer pra que ele tenha atingido o seu objetivo e tenha salvado alguns golfinhos.

Nota: 8.0

2- Filho da Babilônia (Son of Babylon, 2009, Iraque)

Esse foi o indicado do Iraque pro Oscar do ano que vem. Ele me lembrou um pouco de Central do Brasil, na medida do possível. Um menininho meio inocente, cruzando o país pobre a procura do seu pai com a ajuda de uma senhora idosa (nesse caso, a sua avó). Com a diferença que aqui é um país pós Guerra, depois que os Estados Unidos invadiram o Iraque pra acabar com o governo do Saddam. O filme parece bem determinado a mostrar a miséria e os estragos que o regime totalitarista de Saddam trouxe pra população iraquiana. Como as cartelas finais nos mostram, milhões de iraquianos foram presos e perseguidos por Saddam, e grande parte acabou em cemitérios coletivos, sem identificação, e sem a menor possibilidade da família encontrar os seus restos, ou de sequer saber o que aconteceu com a pessoa, se está vida ou morta. As pilhas de corpos me lembraram um pouco os campos de concentração da Segunda Guerra, enquanto a procura por alguém que foi levado por um governo totalitarista, sem você conseguir saber que paradeiro ele teve, me lembra muito nossas próprias questões com a ditadura. Mas o filme, em si, é mediano... A criancinha é muito boa, difícil não se envolver. Mas acho que o filme se preocupou muito em mostrar a situação do país, e muito pouco em contar uma história. Mas ainda assim é válido.

Nota: 6.0

3- Buraco Negro (L'autre Monde, 2010, França)

Esse é um filme francês, e isso já diz muita coisa. Lendo a sinopse, "O adolescente Gaspard passa o verão no sul da França com a namorada e um grupo de amigos. Tudo vai bem, até eles encontrarem um celular perdido. Indo atrás do dono, se deparam com o mesmo morto em uma estranha cerimônia de suicídio. Ao lado dele está, desacordada, a bela e sedutora Audrey. A moça de visual gótico logo atrai Gaspard, levando-o a adentrar um mundo virtual chamado Black Hole, onde ela vive uma vida paralela e atende pelo nome de Sam. Criando para si próprio um avatar, Gaspard se deixa seduzir pelo jogo dela, ignorando o perigo que o aguarda.", vamos combinar que nada de muito normal poderia vir, né? O que me fez ver o filme? O comentário geral era que tinha o elenco mais bonito de todos os filmes que tinham sido anunciados até agora pras cabines. Sim, meus caros, críticos de cinema também podem ser fúteis. A história, que poderia gerar um filme de terror teen, vai mais pra um clima bizarro, com cenas de videogame, personagens góticos, contrastando com uma França ensolarada de verão. Durante boa parte da projeção, achei o filme meio enfadonho, mas lá pro final, vira mais um thriller psicológico, com algumas reviravoltas interessantes. O filme não é de todo ruim, mas não chega perto de ser um filmaço também.

Nota: 5.0

Aqui começa meu segundo dia:

4- Zona Sur (Zona Sur, 2009, Bolivia)

O Festival tem dessas coisas, né? Não lembro de nunca ter visto um filme boliviano na vida, e adoro ver coisas assim, nem que seja só pra entender um pouco melhor a cultura daquele país. Infelizmente, esse filme não é bom. Em primeiro lugar, o diretor decidiu que a câmera nunca poderia parar, ele está constantemente em traveling. Ou seja, se você tem labirintite, passe longe desse filme, porque ele não para de rodar, nem por uma cena. Isso poderia ser interessante se fosse ao menos justificado, mas nada na história leva a crer que faria sentido a camera rodar. A história é quase uma novela do Manoel Carlos. Nada acontece de muito relevante e constantemente as pessoas estão fazendo refeições, tomando cafezinhos, discutindo a situação econômica, estudos, preconceito, casamento. Ou seja, a câmera roda o tempo todo, dentro de um único cenário, que é uma casa de classe média-alta em decadência, onde nada de muito relevante acontece. Divertido, né? É um retrato de uma classe, muito parecida com a que temos no Brasil? Sim. É o suficiente pra ser interessante? Não. Gostei da Ninón de Castillo, que interpreta a mãe de uma família meio desconjuntada. Achei a história do filho, que perde um Toyotta num jogo de poker, a mãe grita com ele (e nem tanto, minha mãe teria me feito ver sangue se eu perdesse um carro no jogo), e depois pede desculpa por ter gritado. Mães-madames podem ser condescendentes, mas nem tanto, né?

Nota: 3.0

5- Nossa Vida Exposta (We live in public, 2009, EUA)

Taí um filme que eu não esperava nada e me surpreendeu. A sinopse anunciava um doc sobre pessoas que tinham sua vida exposta na internet, que passaria na mostra midnight. Mas o doc é muito mais do que isso, é focado na vida de Josh Harris, um cara que teve idéias brilhantes sobre a internet quando ninguém ainda considerava o impacto que isso teria em nossas vidas. Depois de ficar milionário do dia pra noite, e fundar uma das primeiras Tvs online do mundo, ele decidiu fazer um experimento. Construiu uma espécie de hotel big brother, onde 100 pessoas viveriam nesse hotel, sem poder sair, sendo filmadas o tempo todo, e teriam toda comida, bebida, drogas, e armas que quisessem. Ótima mistura, né? Pra melhorar a história, eles tinham que passar por interrogatórios que mais pareciam salas de tortura. Depois de experimentar bastante nos outros, ele decidiu fazer o mesmo consigo mesmo. Colocou zilhões de cameras em seu apartamento, e ele e sua namorada Tânia começaram a viver seu próprio Big Brother online. Isso em 1999, bem antes da geração youtube. O bacana é exatamente isso, ver como ele pensou em coisas que seriam corriqueiras muito antes disso acontecer com a gente. O filme infelizmente não tem um desfecho tão interessante quanto o seu meio, o que dá uma sensação de que o filme não é muito bom. Mas só pelos experimentos que josh fez nos anos 90, o filme já vale a pena.

Nota: 7.0

6- Copacabana (Copacabana, 2010, França)

Hora do filme francês do dia. Entre nós, os frequentadores do Festival, costumamos dizer que uma das obrigações que temos todo ano é de assistir pelo menos um filme da Isabelle Huppert. Tem ano que ela tem 4 filmes no festival, ou mais. Definitivamente, ela é o Selton Mello da França, passa o ano inteiro filmando, só assim. E ela é incrível demais. Não preciso nem citar os 1001 filmes que ela fez, não lembro de uma atuação ruim dela (mesmo que eu não ame tudo que ela faça, minha admiração por ela continua intocada). Mas não esperava muito de Copacabana não... Sabe o diretor Marc Fitoussi? Não? Nem eu. E me chame de pessimista, mas eu sou meio desconfiado com diretores que nunca ouvi falar. E tenho que dizer que me surpreendi bastante. O filme é bem clássico, no sentido anti-francês da palavra. Começo, meio, fim, bom desenvolvimento dos personagens. As atuações eram ótimas, o roteiro era tranquilo, leve, comédia dramática. Huppert interpreta uma mulher meio hippie, meio louquinha, que nunca se estabelece em lugar algum, e com isso ganha o ressentimento da sua filha, que anseia por estabilidade. Ela então aceita um trabalho na Bélgica, só pra provar pra filha que pode assumir responsabilidade, e juntar um dinheiro pra ajudar no casamento da filha. Não é um filme imperdível, mas é divertido, gostoso de assistir.

Nota: 7.0


Amanhã tem mais, eu acho...

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Péssimo serviço no GNC Cinemas Blumenau

Estava guardando esta postagem para o site principal do Cineplayers, em uma melhor oportunidade. Moro em Blumenau e aqui há o monopólio do GNC Cinemas, grupo gaúcho. Não sei como funciona nas outras cidades, mas em Blumenau o serviço é desastroso. Tanto que nos últimos meses praticamente não frequentei mais, apenas vou esporadicamente, simplesmente não dá vontade. Abaixo a lista das reclamações, que já tanto me incomodaram mas hoje parecem simplesmente desimportantes:

- Poucos filmes importantes. Somente os filmes mainstream (e nem todos, geralmente os piores) chegam às suas salas.
- Quando algum filme importante chega, vem com semanas de atraso.
- Atendimento lento para quase tudo.
- Atraso nas projeções (de até cinco minutos, o que já é irritante).
- Permite entrar após horário (houve casos em até mais de 20 minutos, é frequente isso). Atrapalha demais quem quer estar envolvido na experiência fílmica.
- Não consegue conter o público adolescente com seu falatório, máquinas fotográficas e aparelhos celulares.
- Atendimento online fraco e às vezes inexistente, com respostas vagas e nada esperançosas - na maioria das vezes não são recebidas.
- Exagero na climatização: geralmente o ar é muito gelado, ou seja, ir lá faz mal à saúde.
- Quando A Conquista da Honra deu problema na exibição, o filme foi parado e voltaram a passá-lo mais pra frente, ou seja, deixaram de passar uma parte.
- Promoções e vantagens mentirosas: por exemplo, o cartão de 3 meses gratuito chega com pouco mais de 2 meses e meio de disponibilidade de uso.
- O próprio gerente interrompe o filme APÓS o início do mesmo, solicitando que pessoas não deixem espaços em branco nas fileiras de poltronas. Antes do filme, tudo bem; depois, ridículo.
- Programação da próxima semana liberada apenas horas antes de sexta-feira, o que impossibilita qualquer planejamento melhor dos filmes a serem assistidos.
- Não funciona em alguns feriados (ex.: véspera de Natal e Natal/2008).
- Programa de fidelidade lotado de regras inconsistentes, como se você PAGAR por 4 ingressos em um só dia, mesmo que seja para uso próprio, só contará 2 ingressos.
- Propagandas junto aos trailers, como se o filme fosse gratuito.