terça-feira, 5 de outubro de 2010

Segunda-feira

Dia de filmes fora do comum:

Film socialism, Jean-Luc Godard
Acho importante começar dizendo que para mim Godard é o diretor que mais domina o fazer cinematográfico - não só entre os atuais, mas entre todos os que já assiste. Isso transparece em seus filmes e também textos. Godard é o tipo de realizador que não precisa mais provar o que quer que seja. Dito isso, essa parece ser a maior dificuldade do seu cinema atual: embora apoiado numa elaboração imagética rica e inventiva, ele é pouco "comunicativo" - e que fique claro que cinema não precisa de forma alguma ser comunicativo para ser bom.
Film socialism nos dá pouquíssimas portas para entrar em seu universo de discussão mesmo que jogue os elementos na nossa cara com veemência: a discussão da proliferação da imagem digital, as questões políticas da Europa contemporânea e as relações entre o público e o íntimo na imagem. Resta-nos mergulhar numa montagem vertiginosa por associação de imagens, jogos de palavras e sobreposições de ideias em constante deslocamento - aí o cenário de um transatlântico parece bastante pertinente. O filme torna-se mais "acessível" quando desloca-se para o conflito entre pais e filhos rodeado pela câmera intrometida de uma jornalista. De qualquer forma, continua sendo uma experiência única de cinema - mesmo com a sensação de estarmos assistindo do lado de fora.
Nota: 8

Ex isto, Cao Guimarães
Cao Guimarães é um diretor que geralmente opera entre os domínios do documentário e do experimental. Neste novo filme, ele agrega o registro ficcional - sem abrir mão dos outros dois elementos. É impressionante como o filme consegue passar de uma coisa à outra sem perder sua beleza e a sua unidade como narrativa. Seu ponto de partida é a livre adaptação da obra Catatau, de Paulo Leminski. Assim, temos Réné Descartes fazendo sua viagem imaginária ao Brasil - este bastante concreto. Primeiro, em uma certa relação com o país do passado: a floresta, os animais, a natureza. Depois, em plena cidade de Recife - nos trechos em que o curto-circuito de registros do filme chega ao seu ápice. Temos uma câmera que acompanha João Miguel encarnada de Descartes pela ruas da cidade e interagindo com as pessoas: personagens reais e o fictício interligados pelos acontecimentos captados pela câmera. O filme ainda passa por uma espécie de surto/performance belíssima de João Miguel, renascido pela experiência.
Nota: 9

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