quinta-feira, 3 de abril de 2008

É Tudo Verdade: A Voz de Bergman


Mostra Especial

A Voz de Bergman (The Voice of Bergman. Gunnar Bergdahl, 1997):


Acompanhados por Malu Mader na platéia, assistimos a essa conversa/aula com o diretor sueco, morto ano passado. Um documentário preocupado em conhecer a metodologia, os gostos e as vontades de um dos diretores mais prestigiados pelos estudiosos/amantes de cinema. Uma conversa em 8 atos, todos relacionados ao cinema e sua magia. Uma magia que Bergman considera como potencialmente prazerosa, já que ao juntar as várias anotações de seu caderninho transformando-as em uma coisa só, a poderosa sensação de ser o arquiteto das situações de uma vida é o melhor jogo de todos. Ao mesmo tempo em que não há motivo para a existência de um filme sem que ele consiga emocionar o espectador.

Às vezes os personagens saíam de sua cabeça e iam andando por conta própria, ao que Bergman precisava segui-los e isso era um pouco trabalhoso, dizia ele. Aliás, segundo conta, seus roteiros escapavam ao tédio comum embutido a esse tipo de texto, já que ele minuciosamente se dava ao trabalho de escrever as cenas falando de suas cores, cheiros e até dizendo claramente aquilo que gostaria de ver ao fazê-la para que fosse visualmente aprovada por todos os participantes do processo, principalmente os atores. E é fácil perceber que o diretor se empolga não somente com a amarração das tramas, mas com a criação de imagens, e em algum momento o vemos falar sobre o cinema mudo em que toda a experiência sensorial é repassada ao espectador unicamente de forma visual. Com isso pode-se supor algum purismo do sueco, para logo em seguida ouvi-lo dizer que tudo se transforma com o tempo, inclusive o cinema, dando a entender que chegou o dia em que só as imagens não sustentavam a transmissão de emoções.

E tremei amigos: ele não se esquece de falar sobre os críticos, dizendo que durante algum tempo eles participavam de discussões com os cineastas, e ele mesmo gostava de ouvi-los por sua erudição e embasamento. Atualmente, no entanto, ele consegue perceber que a necessidade urgente de criticar, devido ao acúmulo de produções, empobrece o trabalho, no sentido em que não há mais tempo para discussão e amadurecimento sobre a sensação de assistir às produções. Aí é que entra uma dúvida minha: em outro momento da conversa, Bergman cita um compositor que diz nunca ter compreendido a música, apenas aprendeu a senti-la, para afirmar que se você se esforça para entender o cinema de alguém, perde o foco real da atenção que são os sentimentos proporcionados pela película. Se estivesse lá, eu perguntaria: então o papel da crítica é o de confrontar opiniões acerca das sensações proporcionadas pelo filme? Bem que alguém já disse que a crítica é algo subjetivo, e nesse caso Bergman me deu mais uma peça desse quebra-cabeça que é entender o que venho fazendo, inclusive agora enquanto falo sobre este documentário, enquanto falo sobre ele.

Essa é uma compreensão que ele estende ao fazer-cinema. Durante a entrevista diz que assistia a todas as produções suecas de um ano durante o verão, e percebia na nova safra de diretores de seu país um grande talento para compor imagens e enredos, na montagem e na escolha das seqüências certas aos fins que se propunham. No entanto, Bergman sentia que todo o apuro técnico encontrado nisso não conseguia encobrir a deficiência – comum entre os novos – de não saber tocar o coração de sua própria história. E quando falo ‘coração da história’ estou reproduzindo a própria figura utilizada pelo diretor, e não usando uma licença poética para interpretá-lo. Ligado a isso, ele resume a ‘eficiência’ de um filme à fidelidade da produção à verdade do diretor/criador, ao tal ‘coração de sua própria história’. Afinal é isso que vale, e o que cabe ao espectador é conectar-se a essa sensibilidade, senti-la também.

Engraçado é vê-lo comentar sobre a infrutífera idéia de um filme em extreme close-up, da força dessa imagem de outro ser humano em close hipnotizando a platéia, sendo que neste documentário praticamente a imagem que se vê é a do diretor, não exatamente num close super, mas apenas ele, falando e hipnotizando a todos nós. Da mesma forma é engraçado vê-lo dizer que festivais são uma coisa cabível à indústria do cinema e interessante dentro do processo de venda dos filmes. Até legais, segundo ele, apesar da desconfiança de que se possa absorver mais de dois filmes por dia. Ao final diz que muitos festivais podem ser feitos, sem que no entanto o convidem. E ele aqui, como uma das figuras especiais deste festival. Pobre Bergman?

Termino como ele, dizendo que é melhor parar por aqui, pois eu poderia falar sobre esse documentário durante horas...

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